
[Este texto tem correções e atualizações feitas na manhã de 10/05/2017]
É de outubro 2016 o álbum do português António Zambujo com a obra de Chico Buarque.
Chama-se graciosa e inteligentemente Até pensei que fosse minha. É o que mais podemos esperar de um intérprete.
Quase ninguém sabe disso, da existência desse CD, como é comum nesta era de pequenas tribos a valorar o que é mais elevado na música e na cultura.
Acima das tribos, claro, engula-se o relativismo crítico que promove a hegemonia até de certos nojos, putativamente gêneros musicais. Mas deixa pra lá.
Há tempos não ouvia um trabalho de intérprete dedicado a uma única obra (cancioneiro, songbook em português) tão feliz na escolha do repertório, no canto e elaboração dos arranjos.
Pois Zambujo fez o melhor disco de intérprete de Chico Buarque.
Penso que apenas, entre cantores, Caetano Veloso poderia alcançar um resultado tão singelo e elegante, se se propusesse a isso, pois sabe, como Zambujo, que Chico sempre foi o melhor cantor da própria obra [ver área de comentários].
Olhe aqui a versão do baiano de Januária, do antológico Contemporâneos (2003), de Dori Caymmi.
Repertório
Dezesseis faixas (ver abaixo) logram um perfil poético e melódico apurado da música de Chico. Não é um feito qualquer diante de uma obra extensa e qualificada como a buarqueana.
Vão cronologicamente de Januária e Até pensei, canções do LP Chico Buarque –Volume 3 (1968), à linda valsa Nina, do disco mais fresco de Chico, de 2011.
Da música mais recente de Chico, para qual ingenuamente não se dá muita bola, aparece ainda Cecília e Injuriado, do álbum As cidades (1988).
Dentro do esbelto conjunto destaca-se o dueto de Zambujo e Roberta Sá em Sem fantasia, no qual Roberta abre a canção acompanhada por um contrabaixo. É bonito de chorar.
Canto
Zambujo tem no timbre e na divisão a delicadeza essencial que essas composições demandam.
Interpretar Chico Buarque não é qualquer firula; e apostar no peso da obra para o sucesso fácil, um engano que tem frustrado dezenas de cantoras e cantores.
Ouvir O sotaque de António Zambujo e a colocação pronominal portuguesa é reconfortante para os ouvidos cansados dum brasileiro.
Chico Buarque e Carminho também estão no CD.
Arranjos
Jobim ria de quem lhe criticava por usar “poucas notas”. “Sim, são poucas, mas apenas as melhores”, gozava.
Os arranjos deste disco têm a economia acústica que procura apurar as sensações, o encantamento alguma vez, uma economia joãogilbertiana, por assim dizer.
Violões, bandolim, clarineta, acordeom e pouco mais retecem a leveza da rede de melodias, de maneira a ressaltar e até reinventar nuanças das harmonias originais.
Se o leitor tem Spotify o disco está aí.
Ao leitor
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Concordo, Paulo. E exatamente isso me faz gostar tanto deste disco. Sinto que o Zambujo buscou uma sintonia com a delicadeza com que Chico aborda suas músicas. Ou tem naturalmente uma influência. Abraços.
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Caro Antônio Siúves, a dica é interessante, mas, para mim, as melhores gravações das músicas do Chico são com ele mesmo.
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